terça-feira, 31 de março de 2009

Artigo publicado na seção Opinião da Revista RI, edição nº 123

Uma nova realidade para as empresas

A atividade de relatar tem ganhado cada vez mais importância para as empresas. O aquecimento no mercado financeiro nessa década, bem como o grande número de abertura de capital das empresas, traz à tona a necessidade de as empresas serem transparentes com o mercado e, assim, obterem uma precificação justa.
Essa atividade passou a ser mais complexa desde as primeiras versões das diretrizes da Global Reporting Initiative (GRI), lançadas em 1997. As empresas que optaram pela adesão a essas diretrizes internacionais de reporte baseadas em princípios foram obrigadas a realizar uma reflexão interna antes de relatar suas experiências.
A emergência do padrão contábil internacional, International Financial Reporting Standard (IFRS), demonstra que essa reflexão interna será uma tendência. Assim como as diretrizes da GRI, o IFRS, que atualmente já conta com a anuência de mais de 100 países, também se baseia em princípios.
Assim, uma nova realidade se apresenta para as empresas. E o que fazer diante de tal desafio?
De maneira geral, caberia às empresas relatar tudo aquilo que lhes causa impacto. Mas, por exemplo, caso algum executivo tenha uma doença grave, isso causaria certo impacto interno, sem, no entanto, prejudicar os resultados da empresa. Reportar isso apenas expõe uma intimidade do executivo, sem ter a menor relevância para o mercado.
Esse é um exemplo simples e óbvio. Porém, a decisão de reportar a partir de princípios como o da transparência tem se tornado uma atividade complexa.
Uma estratégia para facilitar a tomada de decisão do que deve se tornar público é pensar se a informação trará ou não impacto à precificação da empresa. Parece uma abordagem com viés econômico, mas é preciso lembrar que, em um mundo no qual a sustentabilidade faz parte da agenda, problemas sociais e ambientais têm impacto nessa precificação. Assim, algo deve ser relatado quando, se tornado público, afetará o valor da empresa positivamente ou negativamente.
Em um mundo no qual a velocidade da informação é cada vez maior, conseguir tomar a decisão do que reportar sem que esse processo seja lento e cause uma precificação errada da empresa exige mudanças dentro das corporações.
A discussão do que tornar público deixa de ser das áreas de comunicação e relações com investidores e passa a envolver outras áreas. Os relatórios anuais, de sustentabilidade e as demonstrações financeiras deixarão de ser materiais de áreas específicas para passarem a refletir de fato um relato de toda a empresa.
As empresas que quiserem ter uma precificação justa reconhecida pelo mercado precisarão, então, montar um colegiado de divulgação. Colegiado esse bastante semelhante aos comitês de divulgação exigidos pela Sarbanes-Oxley, mas, no entanto, apto a dar respostas às questões sociais e ambientais. A composição desse colegiado deve ser multidisciplinar, envolvendo as áreas contábil, de relações com investidores, responsabilidade social, engenharia, operação, governança corporativa, meio ambiente, comerciais, entre outras.
Cada descoberta, desenvolvimento de novo produto, impacto causado por acidentes, terá que ser discutido e será, então, decidida uma estratégia para abordar e lidar com o assunto.
O exercício de relatar não será mais uma atividade anual ou trimestral, passará a ser uma atividade diária e que envolverá todas as áreas da empresa. Nessa nova realidade, a empresa passará a olhar para dentro e conhecer integralmente todas as suas atividades.Somente assim, serão proporcionadas ao mercado informações com transparência e que diminuam a assimetria durante a precificação de um ativo. Isso trará mais confiança para se tornarem detentores das ações por um prazo mais longo como, também, aumentará a confiança dos demais stakeholders.